NEGRO ROM

NEGRO ROM
INICIATIVA QUE RECONHECE A DIFERENÇA

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Horas Vagas


Esses que são os dias de anseio

De tão dispersos os pensamentos se voltam a ti

Desejosos de uma imagem em que perco o veio

Não é possível mais ficar aqui

Nessa cama-refeitório de lágrimas

Sala de espera de miseráveis

É a instabilidade dos pulsos estáveis

O banquete que mantém minhas horas vagas.

Na verdade, permeado de enganos voluntários,

Tem hora que só me dá vontade

De sentir o coração palpitar mais forte

Mesmo que seja por chorar uma paixão mal resolvida

Que de tão intensamente vivida

Me deixou sem norte.

*Poesia de Márcia Lessa e Alexandre Lessa.

Licença Creative Commons
O trabalho Horas Vagas de Alexandre Lessa foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Quem Tem Medo da Literatura Contemporânea? (Um Texto Direcionado para Os(As) Futuros(as) Escritores(as) Sem Medo)

(A.Lessa)

O poder na primeira pessoa
Poder em última instância
A mão alcançando o chapéu,
Acima de qualquer circunstância
Poder, poder, poder,
poder até não mais poder.

(O Poder - Marcelo Nova)


Ser humano gosta de poder.
Ser humano é gostar de poder, e do poder.
Ser humano gosta mesmo é do poder.
O universo literário, tão cheio de liberdade, está embriagado do medo da perda. Não é incomum a discussão sobre direitos autorais, sobre os creative commons da vida... Sobre de quem é o poder acerca da criação. O escritor, por mais humilde que finja, tem mania de Deus. Tende a ser o dono de seu universo criativo, da obra de arte – não mexa! Pode quebrar...

O escritor sabe que suas idéias são frutos de suas relações, mas prefere deixar subentendido. Sabe que o livro não vai sumir com o advento da tecnologia, no máximo ocorrerá mudanças no formato - mas mantenha o alarme ligado!
Tão hábil na criação do novo, mas quando falam de cyberliteratura... retrocesso.

E o leitor, o que pensa?
Ora, o leitor é ser humano.

Invoco Charles Dodgson para responder esse problema de lógica:

- Ser humano gosta do poder.
- Escritor gosta do poder.
- Leitor é ser humano.

Será que... leitor = escritor?!

Se sim, de quem é a criação? Quem tem a força, He-man?

Não tenho plena certeza, mas acho que o leitor aprendeu a gostar de interagir com o Big Brother (o da Globo mesmo. Quem dera fosse o de George Orwell...). Gostou de jogar. Talvez queira interagir de forma mais lúdica com a obra literária, não sei... Acontece que essa indefinição nos papéis está causando um rebuliço no mundo literário. E, onde há muita liberdade, há quem se sinta desprestigiado, ou seria desapoderado? Eu diria mais: amedrontado.

Em tempo:

- Charles Dodgson era matemático.
- Charles Dodgson adorava lecionar Lógica.
- Lewis Carrol escreveu Alice no País das Maravilhas.
- Lewis Carrol adorava Fotografia.
- Charles Dodgson é Lewis Carrol.

Será que... matemático = professor = escritor = fotógrafo?

Afeito às novidades, eu quero é mais. Até brincar com meus sofismas... Ou seriam silogismos disfarçados?

P.S: Sou escritor, ser humano, e gosto de poder... poder ser livre.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Nossa Ligação

(A.Lessa)



O celular vibrou
E eu atendi
Crendo ser você
Já não agüentava mais esperar
Pra te ouvir
Dizer com a voz tão meiga:

“- Olá... Meu bem?
Eu te acordei?
Me desculpe pela hora...”

Mas a vibração agora
Atende ao meu chamado
É aprazível e alonga
Nossa ligação.


* Essa poesia, pequenina e singela, da qual tenho carinho especial, faz parte do livro "Negro Rom" de Lessa e Peu.

domingo, 22 de agosto de 2010

Gorillus morbiddus

Me dê um beijo meu amor
Eles estão nos esperando
Os automóveis ardem em chamas
Derrubar as prateleiras
As estantes, as estátuas
As vidraças, louças
Livros, sim...

Caetano Veloso - Proibido Proibir


Após uma semana de divulgação do livro Negro Rom fui flagrado desejando, ignobilmente, sofrimento, dor e sangue. Calma. Era um desejo situado, unicamente, no plano voyeurista. Nada de materializações.

Curiosamente esse afã, mesmo nos cidadãos mais pacatos, se manifesta com relevante freqüência. Quem nunca desejou quebrar o que (ou quem) estava pela frente? É um resquício de nossa descendência símia, não há que se envergonhar, acho...

O final de semana chegou e, acompanhado dele, o espírito simiesco desejoso de poder. No meu caso o poder era irrelevante, só queria mesmo alimentar uma espécie de sadismo irreverente, que se fazia tão presente quanto imponente.

Começou no sábado com Abel Ferrara e seu primeiro filme independente, o despretensioso (e de baixíssimo custo) “Assassino da Furadeira” (1980). Quem conhece Ferrara sabe o que esperar. É agora, pensei. Um filme que fala sobre a linha tênue que nos separa da insanidade. Fui agraciado com banhos de sangue, e uma violência aparentemente sem propósito, mas não: eu entendia aquela violência, aquela raiva, aquela furadeira elétrica destruindo miolos, espalhando catchup como manda a receita dos mais consagrados filmes B. Beleza.

Confesso que deu uma relaxada, mas meu primata interior queria mais. A noite chega, e o domingo também. Descobri passando na TV o filme “Sexta-feira 13” (2009), o novo que não é remake. “Vamos lá macaquito, você tem a força”.

Sou fã do Jason, mas esse filme me fez dormir... Logo no início uma mulher siliconada, doida pra dar, mostrou os seios, mas nem isso foi legal... Mais fraco que o Sexytime, do Multishow, pelo amor de deus. Mortes bobas, com cheiro de coisa sintética.

A produção mais rica toma o lugar da independente. A independente, geralmente, é discriminada por ser... independente! E o macaquito, como fica? E o macaco, caralho?!

Ferrara, diferente, inteligente, pouco conhecido e com baixo orçamento conseguiu alimentar o Neanderthal que há em mim. Já o Jason atual, de Michael Bay, só o adormeceu. De uma certa maneira isso foi esclarecedor: se até um macaco consegue reconhecer qualidades na diferença, para um ser humano isso também não deve ser difícil.

domingo, 15 de agosto de 2010

Negro Rom - (J.C.Peu e A.Lessa)

Capa: Thiago Miranda de Oliveira.


Depois de muitas citações neste blog, e uma semana sem postagens...


Negro Rom, de José Carlos Peu e Alexandre Lessa, é publicado pelo Clube de Autores!

Um projeto iniciado em 2003, engavetado em 2005, e agora, após uma série longa de revisões, vem a público em 2010!

O livro é composto por poesias de temas diversos, mas com um objetivo em comum: discutir sobre a alteridade (reconhecimento da diferença).

Os colegas leitores da "Secretistas" acompanham nossa missão pedagógico-literária de apresentar um trabalho livre de preconceitos, e pró-alteritário. Negro Rom é anterior, embora com lançamento posterior, a tudo isso.

Negro Rom é o pai tímido deste blog. Severo, amável, poético e secretista. Um sonho bom de liberdade artística e literária.

Link no Clube de Autores: Negro Rom (J.C.Peu & A.Lessa); 1ª Edição. Rio de Janeiro. Clube de Autores, 2010.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Racismo à Brasileira

(José Carlos Peu)

Recentemente tenho escrito crônicas sobre o racismo partindo, porém, de minha própria vivência. Alguns amigos teceram comentários sobre meus escritos, alguns elogiosos, outros nem tanto. Nesta crônica, me proponho a aprofundar mais este mesmo tema, e ao mesmo tempo responder alguns comentários que recebi. As respostas estarão espalhadas por todo o texto.

Florestan Fernandes disse, numa frase lapidar, que a sociedade brasileira desenvolveu o preconceito de ter preconceito. Pesquisas recentes comprovam isso ao mostrarem que 89% dos brasileiros concordam que o Brasil é um país racista, mas, menos de 10% das mesmas pessoas que reconhecem este fato se auto-declararam racistas. A pergunta que os pesquisadores estão até agora se esforçando para encontrarem a resposta é: Como pode um país ser racista sem a existência de cidadãos racistas?

Na realidade, o preconceito existe, e é facilmente observável se atentarmos às seguintes questões: Se o número de negros e pardos é de 49% da população brasileira, por qual motivo o percentual de jovens negros e pardos no ensino superior é de apenas 2%? Se a Bahia é o estado com o maior número de negros no Brasil, por qual motivo as maiores cantoras do principal ritmo musical baiano, o axé, são brancas? Se o número de jogadores de futebol negros é tão elevado no Brasil, por qual motivo o número de técnicos de futebol negros é tão diminuto?
Qual a explicação para o fato de termos tão poucos apresentadores (as) de programas de televisão negros num país onde, repito, 49% da população são negros e pardos? Qual a explicação para o fato de que 99,9% dos comerciais de automóveis serem protagonizados por pessoas brancas? Paremos por aqui, posto que mais detalhamentos desta vergonhosa situação é extremamente cansativa tanto para mim, quanto para quem vier a ler esta crônica.

Antes de responder a qualquer dessas questões, meditemos em outra, por qual motivo um número enorme de pessoas continuam dizendo que não existe preconceito no Brasil? Dentre tais pessoas, até mesmo vários negros e pardos procuram defender a tese de que não existe racismo no Brasil. Um sociólogo francês, chamado Pierre Bourdieu, morto no ano de 2002, pode nos ajudar a entender um pouco por que se dá tal fato. Entre as muitas de suas contribuições encontramos um conceito bastante trabalhado por Bourdieu, o conceito
de violência simbólica. De que se trata? De forma resumida, a violência simbólica é um tipo de violência onde a vítima não consegue perceber que sofreu um ataque a sua dignidade. É
uma imposição dissimulada de um capital cultural imposto como superior a todos os outros capitais culturais, que nem mesmo conseguem perceber a dominação sofrida. É importante entendermos que este processo tem de ser dissimulado sempre, caso contrário a violência não será simbólica, sendo, também muito mais fácil de ser combatida. Da mesma forma, a vítima da violência não pode perceber este processo.

O preconceito no Brasil é assim, dissimulado, onde a maioria das pessoas que o sofrem não conseguem perceber, e onde um capital cultural de uma elite branca é imposto sobre todos os outros capitais culturais. Apenas muito recentemente na sociedade brasileira a questão do
preconceito se tornou parte dos principais debates na sociedade. Isto é bom, posto que se uma pessoa que sofre com fortes dores de cabeça, ou de depressão profunda, não se reconhecer como alguém que padece de um sério problema e que precisa de algum tipo de tratamento, dificilmente se verá livre de sua doença, ou pior que isso, poderá sentir na pele o agravamento de sua situação.

Se temos algum tipo de preconceito, o melhor que temos a fazer é enfrentar isso por meio de mais informação sobre a nossa situação. Não adianta nada ter preconceito de ter preconceito. Geralmente este remédio simples, mais informação de fonte confiável, consegue combater os principais sintomas desta doença.

José Carlos Peu. 08/2010.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Ficção Científica

(José Carlos Peu)

Até meados da década de 1990, ‘2001, Uma Odisséia no Espaço’, ‘Blade Runner’, ‘Star Wars’, eram considerados ‘clássicos’, o que melhor se fez no cinema de ficção científica. Com um ou outro título sendo acrescentado ou retirado desta lista dos melhores, exemplo de ‘E.T. O Extraterrestre’, ‘Laranja Mecânica’, ‘Contatos Imediatos do 3º Grau’, ‘O Dia em Que a Terra Parou’, ‘O Planeta dos Macacos”, etc, tudo já estava definido. Parecia que tudo era um fato consumado e que nada de importante surgiria. Porém, esqueceram de avisar isso a Andy e Larry Wachowski, e eles lançaram em 1999 ‘Matrix’, filme que tornou-se a ‘pedra de toque’ de todos os outros filmes de ficção científica por um bom tempo.

A importância de uma obra de arte não pode encerrar-se em si mesma. Tal importância reside, em minha opinião, muito mais na capacidade de influenciar outras obras de arte em seu ramo e, até mesmo, influenciar obras em outras mídias. Neste quesito, é fácil entendermos a importância do filme ‘Matrix’ para a cultura, seja ela pop ou não. Este filme influenciou o cinema, posto que a maioria dos filmes posteriores se parecem um pouco com ele. Mas influenciou também quadrinhos, séries de TV, literatura, e até universidades. Não falo apenas dos cursos de filosofia, lembro-me bem de uma aula de antropologia da educação onde o professor discutiu ‘Matrix’ com a turma ao explicar o conceito de realidade pouco antes de indicar um texto do antropólogo Gilberto Velho.

Se tais coisas não são o bastante para atestar que ‘Matrix’ é um dos maiores filmes de ficção cientifica de todos os tempos, o melhor desde ‘2001, Uma Odisséia no Espaço’, e um grande abre-alas para o século XXl, eu não sei mais o que poderia ser o bastante. Darren Aronofsky deu, um pouco antes de lançar ‘The Fontaine’, uma entrevista que dizia que no momento em que assistiu ‘Matrix’ ficou muito triste, pois pensava em filmar uma grande história de ficção
científica, mas, depois de ‘Matrix’, nada mais fazia sentido. Por muitos anos ele tentou escrever um grande roteiro de ficção, até que escreveu ‘The Fontaine’, que segundo ele era o mais espetacular filme de ficção cientifica desde ‘Matrix’. Apesar da brilhante atuação de Hugh Jackman como protagonista da história, quem se lembra do filme ‘The Fontaine’? Eu dou uma ajudinha, o título no Brasil foi ‘A Fonte da Vida’. Alguém se lembra?

O ‘efeito Avatar’ ainda não é plenamente conhecido, mas, ‘Avatar’ não foi o grande filme que todos esperavam que fosse. Mesmo que represente um grande avanço tecnológico, este filme não foi realmente um grande representante na galeria dos filmes de ficção científica. Um filme muito mais barato/simples que ‘Avatar’, e que apresentou um grau de originalidade muito superior foi ‘Distrito 9’. Idéia extremamente original, e com um viés social muito acima da média da maioria dos filmes de ficção cientifica recentes. Novamente digo, em minha opinião, ‘Distrito 9’, de Neill Blomkamp, é o melhor filme de ficção científica desde ‘Matrix’. Uma das grandes qualidades de ‘Distrito 9’ era a mistura de ficção e documentário. Esta técnica, quando bem utilizada, produz um efeito de potencializar a sensação de realidade
nos espectadores do filme. Um filme espetacular que utiliza muito bem esta mesma técnica é o curta ‘Recife Frio’, de Kleber Mendonça Filho, que trata de uma inexplicável mudança climática que faz cair neve em pleno Pernambuco. Este filme é altamente recomendável.

Hoje sabemos que a história é cíclica, e que recomeça a cada instante. Não há motivos para nos fecharmos na velha concepção do que era ‘clássico’, e do que era ‘descartável’. O novo está sendo criado, agora, neste momento, que venham novas histórias!

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Linguagem e Exclusão


“Tem alguma coisa estranha no jeito como você pronuncia as palavras. Você é nordestino?” – Essa pergunta me foi feita por uma amiga num estágio. A minha esposa, também, costuma rir de algumas pronúncias que ela diz serem muito arrastadas. É somente natural que eu carregue o sotaque nordestino na maneira de pronunciar algumas palavras.

A minha família é natural do município de São Lourenço da Mata, em Pernambuco, e veio para o Rio de Janeiro quando eu tinha apenas dois anos de idade. Criado por pais nordestinos e rodeado por tios, tias e sobrinhos com o jeito nordestino de falar, era inevitável que em
algumas palavras as minhas origens se fizessem mais presentes do que em outras.

Notamos que os grandes grupos culturais, mesmo dentro de um mesmo país, diferenciam-se e isolam-se em suas relações. Os signos lingüísticos de maneira geral refletem as diferenças e desmascaram domínios de códigos dispares. “Apesar de pertencermos a uma mesma ‘comunidade semiótica’, há uma diversidade de domínios lingüísticos devido à diversidade das várias regiões que compõem o território brasileiro, onde predominam linguajares com suas características próprias.” (FERREIRA, 1999)

Tratando especificamente da linguagem oral, é inevitável não percebermos a linguagem como porta-voz da exclusão. As pessoas que vão das zonas rurais para os grandes centros urbanos
são geralmente encarados como miseráveis, despreparados, sem cultura, muitos chegam a dizer que tais pessoas ‘nem sabem falar’. É como se a forma como tais pessoas falam não possui valor algum já que não falam como ‘nós’. Deste ponto até a generalização é apenas um passo. Qualquer pessoa que não fale como os citadinos das grandes cidades do Sudeste, o padrão lingüístico para o restante do Brasil, são logo acomodados em grandes grupos tais como ‘paraíbas’, ‘baianos’, ‘mineiros’, etc. Notamos, também, que os sotaques das regiões mais ao
sul são apenas exóticos, enquanto os sotaques das pessoas do Norte e Nordeste são tratados não apenas como exóticos, sendo bastante estigmatizado.

A linguagem, cada vez mais, tende a excluir pessoas que estão fora dos seus grupos culturais de origem e não dominam os códigos lingüísticos do grupo cultural que visam integrar-se, o grupo dominante. Mas, a linguagem, deveria servir para a união dos homens e não para a exclusão. Este é o desafio que, mais do que nunca, se nos apresenta.

Bibliografia:

Ferreira, A. P. O Migrante na rede do outro. Ensaios sobre alteridade e subjetividade. Rio de Janeiro/Belo Horizonte: Editora TeCorá, 1999.

José Carlos Peu, 19 de Julho de 2010. 22:11 h.

domingo, 18 de julho de 2010

Âmbar

(J.C. Alcantara)

Não sou branco
Sou franco,
O negro é pranto,
E, o pranto ecoa pelo tempo,
Lúgubre, lúgubre.

Sou negro,
Sou homem,
Mas, se fosse branco,
Seria um homem
Assim como sempre fui.
Isto está juramentado
E ajuramentado,
Aresto, aresto.

Sou um homem
Como todos os outros.
Não digam o contrário,
Nem criem barreiras!
Uma criança nasce chorando e gritando:
“Acesso, acesso!”

* Poesia extraída do livro "Negro Rom", de Alcantara e Lessa. Em breve publicado pelo "Clube de Autores".

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Banquete dos Mendigos


(A. C. Andano)

Oh, antíteses! Que trazeis hoje?

Um banquete de mendigos?

Um molusco bonachão?

Um cidadão solidário?

HAHAHAHAHAHAHAHAHAHA!!

Traga-me tudo! Estou faminto...

Não há nada melhor que retornar sabendo que é definitivo...
Então, sem temor, relacionemos os três objetos acima. Sim, eles têm muito em comum!

O Banquete dos Mendigos...
Sempre pensei que fosse mentira da oposição, mas há mendigos que fazem sopa de jornal com pedras... Que bizarro! Nunca vi um mendigo saboreando uma dessas, mas um colega me garantiu que é verdade!
Enquanto isso o que temos “dando sopa”? Nosso Molusco Bonachão, claro!! Ele não só fala, como dirige um país! É um primor, e especialmente competente com as palavras! Recentemente defendeu de forma ímpar seu povo contra uma grande entidade desportiva, ele gritou em plenos pulmões (sic, o meu molusco tem pulmão): “Acham que somos um bando de idiotas”.
Não, não acham... Eles têm certeza... E talvez, trocando pelo silêncio, até queiram dividir os lucros do superfaturamento com as obras emergenciais para 2014. Ah, obras que serão pagas pelo ilustre cidadão solidário! Obrigado, cidadão!

Poucos conhecem, mas Banquete dos Mendigos, também foi nome dado a um projeto dirigido por Jards Macalé (o Jards de novo, mas ele merece toda a atenção). O banquete tratava-se de um show comemorando os 25 anos da Declaração dos Direitos Humanos... em plena ditadura militar! Cantores renomados, como Paulinho da Viola e Milton Nascimento, participaram do evento que intercalava músicas e leitura de artigos da declaração.
Naquela época, somente militares podiam ser presidente. Não era permitido imaginar um molusco no poder, quem dirá bonachão! E o cidadão não só era solidário, como subjugado.

Jards foi preso diversas vezes, porque, afinal de contas, lugar de banquete não é no estômago de mendigos.

E então, antíteses? Seria o mundo de hoje melhor que o de ontem?

Hoje podemos escolher o tipo de animal que queremos para presidente. Difícil é distinguir qual deles é humano.

Hoje o cidadão solidário tenta o Habeas Corpus de um total desconhecido. Difícil é usar essa motivação pra algo que preste.

Hoje podemos escolher entre um Banquete dos Mendigos, e uma sopa de jornal com pedras... difícil é não perder o apetite antes...

* A imagem acima é a capa do vinil "Banquete dos Mendigos, (1973)", encontra-se originalmente no endereço da web: http://300discos.files.wordpress.com/2009/08/cc26-jards-macale-o-banquete-dos-mendigos.jpg?w=295&h=300